Crítica | “A Empregada” engana o público — e essa é a melhor parte do filme

Mais um fenômeno literário chegando aos cinemas, com direito a rinha de loirinhas, mas que pode ser bem mais do que só isso.

Em A Empregada, uma jovem começa a trabalhar na casa de um casal extremamente rico, mas tanto ela quanto seus patrões escondem segredos sombrios. O suspense é baseado no romance best-seller da autora Freida McFadden, conhecido por brincar com expectativas e reviravoltas morais.

Cena do filme “A Empregada”. Crédito: Divulgação/ Paris Filmes

Temos aqui mais uma estreia com Sydney Sweeney como protagonista. E, mesmo ciente das atitudes públicas recentes da atriz — amplamente condenáveis —, a análise aqui se restringe ao que ela entrega em cena, ainda que sua carreira pareça caminhar ladeira abaixo fora das telas.

O filme faz aquilo que promete: segue e adapta a história de forma fiel ao material original. E, via de regra, quando os leitores saem satisfeitos, isso indica que a adaptação foi competente.

À primeira vista, a trama não parece ter muito a dizer: uma mulher cheia de segredos vai trabalhar em uma casa igualmente repleta deles. Quando tudo vem à tona, há uma grande revelação e o filme muda de tom. Essa estrutura é comum e geralmente funciona — e aqui não é diferente, ao menos até certo ponto.

Cena do filme “A Empregada”. Crédito: Divulgação/ Paris Filmes

Millie Calloway (Sydney Sweeney) chega à casa e passa a ser constantemente maltratada por sua patroa, Nina (Amanda Seyfried), que também começa a desconfiar das intenções da empregada em relação ao marido, Andrew Winchester (Brandon Sklenar). Andrew, por sua vez, assume uma postura quase protetora, confrontando os desmandos da esposa.

Essa dinâmica funciona bem no início, muito por conta da entrega de Amanda Seyfried, que constrói uma personagem capaz de convencer facilmente o público de que ela é a grande vilã da história — enquanto Millie surge como a mocinha que precisa ser salva.

Cena do filme “A Empregada”. Crédito: Divulgação/ Paris Filmes

Mas é quando a verdade começa a se revelar que o longa apresenta, ao mesmo tempo, seus maiores acertos e seu maior problema. A virada acontece, mas a forma como a narrativa muda de direção é, paradoxalmente, a parte mais fraca do longa.

Nesse ponto, entra em cena o arquétipo do “homem salvador”. Andrew precisa enfrentar sua esposa supostamente descontrolada para proteger a jovem pobre que depende daquele emprego. A partir daí, o filme mergulha em um tom claramente piegas — e aqui, no pior sentido da palavra. Tudo fica exagerado, brega e profundamente clichê, a ponto de se tornar constrangedor. Diálogos, trilha sonora e até atuações despencam de qualidade nesse trecho. Tudo o que envolve a relação entre Millie e Andrew soa mal construído e artificial.

Cena do filme “A Empregada”. Crédito: Divulgação/ Paris Filmes

Ainda assim, esse trecho problemático serve como ponte para a verdadeira virada da história, que nos leva para um território muito próximo do terror. A partir daí, tudo muda — e melhora consideravelmente.

Sydney Sweeney entra, então, em uma batalha pela sobrevivência e passa a entregar uma personagem completamente diferente daquela apresentada até então. É nesse momento que tanto a personagem quanto a atriz crescem. Quando Millie assume as rédeas da própria história e se torna ativa na narrativa, o filme ganha força, tensão e identidade.

Cena do filme “A Empregada”. Crédito: Divulgação/ Paris Filmes

Além disso, há um outro aspecto que me agrada bastante: a forma como o longa faz o público repensar sua própria percepção da história. Como a violência doméstica pode se manifestar em qualquer camada social, independentemente do status ou da riqueza.

Nos primeiros atos, é extremamente fácil enxergar Nina como a vilã. Amanda Seyfried contribui muito para isso com uma atuação convincente. O pensamento imediato é: “essa mulher é louca”. O roteiro quer que a gente pense assim. Mas a pergunta que fica é: por que é tão fácil chegar a essa conclusão?

Cena do filme “A Empregada”. Crédito: Divulgação/ Paris Filmes

Nossa falta de questionamento diante dessa leitura é confortável — assustadoramente confortável. E isso diz muito sobre como a sociedade trata as mulheres em inúmeras situações. Elas são apontadas como culpadas muito antes que os contextos sejam compreendidos. O filme evidencia isso com clareza quando olhamos para ele além da superfície.

A Empregada tem inúmeros problemas de construção, especialmente no meio de sua narrativa. Mas quando um filme consegue provocar pensamentos que vão além da tela, ele já cumpriu algo importante. Isso basta para dizer que vale a experiência.

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