Um dos premiados da 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, neste dia 30 de outubro, foi o filme nigeriano A Sombra do Meu Pai, de Akinola Davies Jr., vencedor do Prêmio da Crítica de Melhor Filme Internacional. Apresentado também no Festival de Cannes 2024, onde recebeu menção honrosa, o longa foi escolhido pela Inglaterra como seu representante na disputa pelo Oscar Internacional.
Poucos filmes deste ano se relacionam tanto com o Brasil quanto este. Em um período em que Ainda Estou Aqui conquistou o Oscar de Melhor Filme Internacional, e em que O Agente Secreto desponta como forte candidato, o longa de Davies Jr. ressoa dolorosamente semelhante — uma outra nação marcada por golpe militar, autoritarismo e silenciamento histórico.

Ambientado na crise eleitoral de 1993, o filme parte de uma estrutura simples e profundamente simbólica: um único dia na vida de dois irmãos, Remi e Akin, ao lado do pai, Folarin (Sope Dirisu), em Lagos. O homem, que vive mais longe que perto, surge de repente e decide levá-los pela cidade enquanto tenta receber um pagamento com urgente.
A jornada, contudo, é apenas o pano de fundo. O que Akinola Davies Jr. realmente quer revelar é o olhar das crianças sobre o país — uma Nigéria em ebulição política, captada em meias conversas, nas notícias de rádio e na passagem de caminhões militares. Nada é dito de forma explícita, mas tudo está ali, à vista, sangrando.
Enquanto acompanhamos o tédio dos garotos em casa, a distância da mãe que trabalha e o reencontro hesitante com o pai, o filme transforma o cotidiano em metáfora: a Nigéria é esse pai ausente, fragmentado, ferido e já quase esquecido, que tenta se reconectar com os filhos — tenta protegê-los, ainda que não saiba mais como.
O resultado é tocante pela sua naturalidade. A direção aposta em uma proximidade quase documental, impulsionada pela própria experiência pessoal do diretor e sustentada pelo design de produção de Jennifer e Pablo Anti e pela fotografia de Jermaine Edwards — responsáveis por transformar Lagos não em um cenário, mas em um personagem: barulhento, caótico e, apesar de tudo, ainda esperançoso.
Mas são os jovens atores Chibuike Marvellous Egbo e Godwin Chiemerie Egbo, intérpretes de Remi e Akin, que nos conduzem emocionalmente. É através deles que sentimos o peso da ausência, o encanto das pequenas descobertas e dúvidas sobre o pai e o medo de por um país que ruía ao redor.

A Sombra do Meu Pai é um retrato político disfarçado de lembrança familiar, um filme sobre o que se perde e o que permanece quando a infância e a democracia são interrompidas.
E se há justiça nas premiações, o longa de Akinola Davies Jr. será um dos grandes destaques da temporada.
Nota: 4,5/5
