Crítica | A Natureza das Coisas Invisíveis: A inocência infantil que transforma a morte em ensinamento

A Natureza das Coisas Invisíveis, da diretora Rafaela Camelo, conta a história de duas meninas que se conhecem em um hospital durante as férias e formam uma amizade linda no meio de momentos agridoces.

Cena do filme “A Natureza das Coisas Invisíveis”. Crédito: Divulgação / Vitrine Filmes

Na trama, Glória (Laura Brandão), uma menina de dez anos, acompanha a mãe no hospital onde ela trabalha e acaba conhecendo Sofia (Serena), da mesma idade. Entediadas e frustradas por estarem perdendo suas férias dentro de um hospital, elas exploram o lugar juntas, formando um laço de amizade e compartilhando suas inseguranças. Enquanto Glória lida com sentimentos que parecem não ser totalmente seus desde que passou por um transplante de coração, Sofia acredita que a internação no hospital é o motivo da piora no quadro de saúde de sua bisavó.

O filme, apresentado na quarta noite da Mostra Competitiva de Longas Brasileiros no 53º Festival de Cinema de Gramado, nos conduz a um lugar de aconchego. Mesmo abordando a morte, o faz de forma singela, principalmente por meio do olhar inocente de duas crianças no início de uma amizade.

Elenco e equipe do filme “A Natureza das Coisas Invisíveis” no 53° Festival de Cinema de Gramado. Crédito: Divulgação / Vitrine Filmes

Glória e Sofia são o ápice do filme: elas se encontram em um momento delicado para ambas. Glória sente-se presa ao trabalho da mãe em plenas férias, enquanto Sofia sofre ao ver a bisavó doente no hospital.

A partir da inquietação e preocupação com as filhas, as mães também se aproximam e percebem que podem se ajudar.

Cena do filme “A Natureza das Coisas Invisíveis”. Crédito: Divulgação / Vitrine Filmes

É nesse ponto que o filme se divide em duas atmosferas distintas. A primeira mergulha na inocência e curiosidade das meninas, enquanto elas investigam e se aventuram pelos corredores do hospital. O roteiro e a direção de Rafaela Camelo se beneficiam dessa perspectiva, ao dar os primeiros passos na investigação do sentido da morte.

Já a segunda parte se passa no sítio da bisavó de Sofia. Aqui, parece que o filme levanta a câmera do olhar infantil e a transporta para um plano superior. A bisa é benzedeira, e a comunidade em que vivem compartilha dessa tradição. A discussão sobre o fim da vida se desloca então para algo mais transcendental, ligado à fé e à espiritualidade, afastando-se da curiosidade infantil. Nesse ponto, a mudança de tom soa um pouco incômoda, quase como se estivéssemos assistindo a dois filmes diferentes, percepção confirmada pela própria diretora no debate após a sessão.

Cena do filme “A Natureza das Coisas Invisíveis”. Crédito: Divulgação / Vitrine Filmes

O filme tem cenas belíssimas que retratam com respeito os rituais das benzedeiras. A relação com a partida ganha um ar de aceitação que funciona bem para encerrar a história. Ainda assim, ao olhar para o filme como um todo, há a sensação de falta de um fio condutor mais sólido que conecte todas essas visões.

Outro tema abordado é a “encomenda da alma” de Bento, inicialmente apresentada como se fosse outro filho de Simone. Embora seja uma situação interessante, o roteiro acaba diluindo sua relevância no restante da trama. Mesmo entendendo que a proposta não era transformá-la em um grande conflito, parece faltar sutileza: a revelação poderia ter sido percebida pelo público de forma orgânica, sem a necessidade de explicação direta.

Apesar dessas ressalvas, A Natureza das Coisas Invisíveis é um filme sensível, que trata do luto com delicadeza e poesia. Uma obra que emociona por enxergar a morte através da inocência infantil, ainda que por caminhos narrativos que, às vezes, se afastem demais entre si.

O longa estreia dia 27 de novembro nos cinemas.

Assista o trailer:

Deixe um comentário