O terceiro longa exibido na Mostra Competitiva de Filmes Brasileiros do 53º Festival de Cinema de Gramado, Querido Mundo é dirigido por Miguel Falabella, codirigido por Hsu Chien e baseado na peça homônima de Falabella, escrita em parceria com Maria Carmem Barbosa e encenada em 1993, com Otávio Augusto e Joanna Fomm.

A história se passa em uma pequena cidade do interior, onde Elsa (Malu Galli) vive um casamento desgastado com Gilberto (Marcelo Novaes), um homem rude e abusivo. Cansada da rotina sufocante e das constantes humilhações, ela já não alimenta sonhos nem expectativas para o futuro, até se mudar para o Rio de Janeiro e se ver em uma situação ainda mais desesperadora.
Seu vizinho, o engenheiro Oswaldo (Eduardo Moscovis), também atravessa uma fase turbulenta. Seu relacionamento com Odília (Danielle Winits) está no fim, e um erro grave no trabalho arruína sua carreira, deixando-o sem perspectivas. Às vésperas do Ano Novo, Elsa e Oswaldo acabam presos sob os escombros de um prédio abandonado. Nesse cenário improvável, surge a oportunidade de aproximarem seus mundos, trocarem confidências e viverem momentos tão inesperados quanto transformadores.

A narrativa se desenha como um conto de Natal, reforçado pela fotografia em preto e branco, que transforma uma história dolorosamente real em uma fábula de esperança: a esperança de amar e ser amado verdadeiramente. As feridas da vida estão ali, expostas, mas encenadas com uma teatralidade bonita e, por vezes, quase ingênua.
Grande parte do filme é rodada no formato 4×3, o que reforça esse olhar de testemunha. Somos conduzidos à falência de dois casamentos que não deveriam ter acontecido, sustentados apenas pelo medo, pelo comodismo e pela frustração. Quando a cor finalmente invade a tela, a esperança se revela: ela precisava apenas de um amanhecer ao lado de quem nos aceita como somos.
É como se estivéssemos espiando a vida de Oswaldo e Elsa pela janela, sem permissão para interferir. Eles apenas querem ser ouvidos e vistos, como uma súplica interna de seus próprios personagens.
Há uma explosão no filme, mas o que realmente o torna explosivo é a química entre Eduardo Moscovis e Malu Galli.
São nas atuações da dupla que o filme encontra sua força. Essa é a típica história que se assiste em uma tarde chuvosa, torcendo em silêncio para que o amor aconteça. Os dois nasceram para se encontrar, e a narrativa também depende dessa união para funcionar. É na cumplicidade deles — de duas pessoas que se reconhecem mesmo sem jamais terem se conhecido — que o filme floresce. Num mundo em que todos querem falar, mas poucos querem ouvir, Oswaldo e Elsa encontram, no meio do nada… tudo.
Confesso que a história de Falabella não me conquistou de imediato. O meu cinismo resistia em mergulhar nesse conto de fadas em preto e branco. Mas, ao acompanhar Elsa, percebi como ela é uma personagem profundamente verdadeira. Uma mulher marcada por uma vida de violência, que só encontra espaço para respirar quando suspende, por um instante, o peso do tempo e das convenções. Afinal, por que hoje é tão difícil acreditar no amor?
Querido Mundo não é um filme perfeito. Ele pode, sim, reforçar a ideia incômoda de que, para uma mulher ser feliz, é necessário estar atrelada a um homem e ter seu destino sempre entrelaçado ao matrimônio. Essa leitura é possível — e inquietante. Porém, quando fecho os olhos e lembro de Oswaldo e Elsa, não penso nisso. Penso no quanto eles me tocaram. Assim como Elsa faz referência ao merengue, também vejo o filme dessa forma: Querido Mundo é doce e frágil, derrete na boca e deixa um gosto de querer mais.

Querido Mundo é a história de duas almas desiludidas pelo amor que, contra todas as probabilidades, acabam se encontrando. Um filme que dialoga com corações quebrados de seu público, com nós já endurecidos por esse mundo, mas que insiste em afirmar: precisamos acreditar que não fomos feitos para aceitar o mínimo — o amor é para ser cor, e não dor.
O longa ainda não tem data de estreia confirmada, mas segundo o produtor Júlio Uchoa, a previsão é para o fim do ano ou início de 2026. Fica aqui minha torcida para que chegue aos cinemas no Natal. Afinal, todos merecemos uma dose de boas atuações e a lembrança de que é possível encontrar felicidade mesmo quando tudo parece estar desabando.
